Queridos brasileiros,
Sempre lembrado do
coração grande e da acolhida calorosa com que me estenderam os braços na visita
de fins de julho passado, peço agora licença para ser companheiro em seu
caminho quaresmal, que se inicia no dia 5 de março, falando-lhes da Campanha da
Fraternidade que lhes recordo a vitória da Páscoa: “É para a liberdade que
Cristo nos libertou” (Gal 5,1). Com a sua Paixão, Morte e Ressurreição, Jesus
Cristo libertou a humanidade das amarras da morte e do pecado. Durante os
próximos quarenta dias, procuraremos conscientizar-nos mais e mais da
misericórdia infinita que Deus usou para conosco e logo nos pediu para fazê-la
transbordar para os outros, sobretudo aqueles que mais sofrem: “Estás livre!
Vai e ajuda os teus irmãos a serem livres!”. Neste sentido, visando mobilizar
os cristãos e pessoas de boa vontade da sociedade brasileira para uma chaga
social qual é o tráfico de seres humanos, os nossos irmãos bispos do Brasil
lhes propõe este ano o tema “Fraternidade e Tráfico Humano”.
Não é possível ficar
impassível, sabendo que existem seres humanos tratados como mercadoria!
Pense-se em adoções de criança para remoção de órgãos, em mulheres enganadas e
obrigadas a prostituir-se, em trabalhadores explorados, sem direitos nem voz,
etc. Isso é tráfico humano! “A este nível, há necessidade de um profundo exame
de consciência: de fato, quantas vezes toleramos que um ser humano seja
considerado como um objeto, exposto para vender um produto ou para satisfazer
desejos imorais? A pessoa humana não se deveria vender e comprar como uma
mercadoria. Quem a usa e explora, mesmo indiretamente, torna-se cúmplice desta
prepotência” (Discurso aos novos Embaixadores, 12/XII/2013). Se, depois,
descemos ao nível familiar e entramos em casa, quantas vezes aí reina a
prepotência! Pais que escravizam os filhos, filhos que escravizam os pais;
esposos que, esquecidos de seu chamado para o dom, se exploram como se fossem
um produto descartável, que se usa e se joga fora; idosos sem lugar, crianças e
adolescentes sem voz. Quantos ataques aos valores basilares do tecido familiar
e da própria convivência social! Sim, há necessidade de um profundo exame de
consciência. Como se pode anunciar a alegria da Páscoa, sem se solidarizar com
aqueles cuja liberdade aqui na terra é negada?
Queridos brasileiros,
tenhamos a certeza: Eu só ofendo a dignidade humana do outro, porque antes
vendi a minha. A troco de quê? De poder, de fama, de bens materiais… E isso –
pasmem! A troco da minha dignidade de filho e filha de Deus, resgatada a preço
do sangue de Cristo na Cruz e garantida pelo Espírito Santo que clama dentro de
nós: ‘ “Abbá, Pai!” ’ (cf. Gal 4,6). A dignidade humana é igual em todo o ser
humano: quando piso-a no outro, estou pisando a minha. Foi para a liberdade que
Cristo nos libertou! No ano passado, quando estive junto de vocês afirmei que o
povo brasileiro dava uma grande lição de solidariedade; certo disso, faço votos
de que os cristãos e as pessoas de boa vontade possam comprometer-se para que
mais nenhum homem ou mulher, jovem ou criança, seja vítima do tráfico humano! E
a base mais eficaz para restabelecer a dignidade humana é anunciar o Evangelho
de Cristo nos campos e nas cidades, pois Jesus quer derramar por todo o lado
vida em abundância (cf. Evangelii gaudium, 75).
Com estes auspícios,
invoco a proteção do Altíssimo sobre todos os brasileiros, para que a vida nova
em Cristo lhes alcance, na mais perfeita liberdade dos filhos de Deus (cf. Rm
8, 21), despertando em cada coração sentimentos de ternura e compaixão por seu
irmão e irmã necessitados de liberdade, enquanto de bom grado lhes envio uma
propiciadora Bênção Apostólica.
Vaticano, 25 de
fevereiro de 2014.
Francisco
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