É como se o homem
tivesse perdido o fio da meada, estivesse sem rumo, sem sentido para viver, sem
ter a que ou a quem consagrar a sua vida, pois tudo é muito fútil e vão. Falta
algo ao homem moderno que lhe dê o sentido de plenitude, de felicidade. Ele se
vê em um emaranhado de propostas, mas nenhuma lhe dá o sentido cabal de sua
vida. Falta ao homem de hoje, tão desbravador, a coragem de voltar-se às
questões mais fundamentais da sua existência e desbravar-se a si mesmo à luz de
Deus, autor da vida e realizador da plenitude humana.
São João fala que “Deus
é amor” (1Jo 4,16). No original grego, ele queria dizer: “Deus é amor-doação”.
Aqui, a natureza de Deus começa a se revelar: Ele é aquele que se dá, que se
derrama em amor, por isso cria o céu, a terra, toda a natureza e, por fim, numa
explosão de doação, cria também o homem, dando a ele todas as coisas criadas
para que as submeta e realize-se perfeitamente em sua natureza humana.
Deus cria o homem para
que este seja perfeitamente feliz, e lhe dá o sentido perfeito de sua
existência. E como faz isso? Criando o homem à sua imagem e semelhança (cf. Gn
1,27). Mas que Deus é esse? É o Deus-amor, o Deus-doação. O homem foi criado à
imagem do Deus-amor-doação, e somente nele é capaz de encontrar o sentido pleno
de sua vida. Se encontra o caminho do amor-doação, caminha firmemente, a passos
largos, no sentido da realização plena de sua humanidade, então começa a ser
feliz.
Esta é a vocação do
homem: a felicidade plena a partir de uma vida doada no amor. Realizar-se
vocacionalmente é viver de amor, é dar sem medida. Foi assim a vida de todos os
santos e, até onde se sabe, não se conhece nenhum santo triste, com depressão
ou que tenha se lamuriado por ter consagrado toda a sua existência à salvação
das almas e ao bem dos homens.
O homem moderno pode se
perguntar: “Se Deus é amor e quer o melhor para cada um de nós, por que temos
tanto medo de nos entregar a Ele? Se a realização da nossa vocação é a
plenitude da nossa felicidade, por que resistimos tanto em dizer o nosso sim a
Deus?”
É preciso crer – e
viver – que a vontade de Deus é o centro da nossa realização humana e por isso
não há motivo para retardar a nossa resposta. Quanto mais largo for o nosso sim
e mais rápida for a nossa resposta, mais vamos ganhar, mais felicidade teremos.
Se negarmos essas afirmações, estaremos negando também que Deus é amor;
estaremos negando as Escrituras e tudo que aprendemos sobre Deus até hoje.
Nessa caminhada, o que
Deus nos pede, às vezes, pode nos parecer muito caro, muito pesado. Parece que vai
nos custar muito e que não iremos conseguir dar o nosso sim. É preciso entender
primeiro que responder a esse chamado é ação da graça e somente alicerçados
nesta força, que não é nossa, poderemos dar o nosso sim.
Também é importante
perceber que quando temos dificuldades de dizer “sim” a Deus é porque ainda
temos muitos apegos e a nossa vida ainda não está centrada nele, mas permanece
desequilibrada. Significa que ainda damos um valor demasiado a algo ou a alguém
que não é mais importante do que o próprio Deus. Encontrar esse equilíbrio
também é ação da graça de Deus; da nossa parte, devemos colaborar sendo dóceis
a Ele e nos abrindo à ação do Espírito.
Jesus ensina em Jo
6,44: “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o atrair”. Sobre
essa passagem, Santo Agostinho ensina que Deus, ao chamar, seduz a pessoa
chamada a desejar o mesmo que Ele deseja. A graça vai agindo e fazendo com que
o homem abrace a vontade de Deus não apenas com a inteligência e a vontade, mas
também com todo o seu afeto. Se há abertura para a graça, todas as potências do
homem vão se unindo no sentido de amar o que Deus ama, e então há realização
plena.
Querer realizar
plenamente a vocação pessoal não pode nem deve ser desejo apenas de Deus. O
homem, se usar a inteligência, é capaz de perceber que o que Deus lhe pede é o
mais belo, o mais lúcido, o mais reto, o mais justo. A partir de uma
experiência de fé é possível compreender o chamado que Deus amor-doação faz por
escolha gratuita e, apaixonado por esse Deus, é possível dar uma resposta
generosa. Soma-se à fé o coração, e a este a razão, dom de Deus, que nos impele
a descobrir os melhores caminhos para a plena auto-realização naquilo que o
Senhor, com toda a generosidade do coração, preparou para cada um de nós.
O mundo de hoje nega a
existência de Deus e por isso nega-se a dar essa chance para que Ele dê sentido
à sua existência. Quanto a nós,apaixonados pela vontade de Deus, desejamos dar
pleno cumprimento a ela e ser testemunho de felicidade para um mundo que “espera
ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus” (Rm 8,18).
Que Maria, mãe do
Senhor, que é exemplo de sim generoso, seja nossa intercessora e nos conduza a
essa plenitude!
Escola de Formação
Shalom
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