Nosso Senhor Jesus Cristo chama todos os Seus discípulos à unidade.
Unidos na esteira dos mártires, os cristãos devem professar, juntos, a mesma
verdade sobre a cruz. A corrente anticristã propõe dissipar o seu valor,
esvaziá-la do seu significado, negando que o homem possa encontrar nela as
raízes da sua nova vida e alegando que a cruz não consegue nutrir perspectivas
nem esperanças: o homem — dizem — é um ser meramente terreno, que deve viver
como se Deus não existisse.
A Igreja, como mãe e mestra, deve estar empenhada em libertar-se de todo
o apoio puramente humano para viver profundamente a lei evangélica das
bem-aventuranças. Isso é tão significativo que o próprio Papa Francisco as
fixou como tema dos três próximos anos para as Jornadas da Juventude, colocando
em relevo a misericórdia, o perdão e a acolhida de todos com a mesma caridade
com que Cristo acolhe Seus discípulos. Ciente de que a verdade não se impõe
senão pela sua própria força, que penetra nos espíritos de modo ao mesmo tempo
suave e forte, nada procura para si própria senão a liberdade de anunciar o
Evangelho. De fato, a autoridade da Igreja exerce-se no serviço da verdade e da
caridade.
O anúncio messiânico – "completou-se o tempo e o Reino de Deus está
perto" – e o consequente apelo – "convertei-vos e crede no
Evangelho" (Mc 1, 15) –, com os quais Jesus inaugura a Sua missão, indicam
o elemento essencial que deve caracterizar e ser o centro propulsor da nossa
unidade arquidiocesana: a exigência fundamental da evangelização em cada etapa
do caminho salvífico da Igreja. O Concílio Vaticano II apela tanto à conversão
pessoal como à conversão comunitária. O anseio de cada comunidade cristã pela
unidade cresce ao ritmo da sua fidelidade ao Evangelho. Ao referir-se às
pessoas que vivem a sua vocação cristã, o Concílio fala de conversão interior,
de renovação da mente e da ação pastoral. Assim, cada um tem de se converter
mais radicalmente ao Evangelho e, sem nunca perder de vista o desígnio de Deus,
deve retificar o seu olhar para fazer a vontade d'Ele em renovado ardor
missionário, levando a Boa Nova de Cristo nas redes de comunidade, indo ao
encontro dos que estão afastados.
O Papa Francisco, na sua Encíclica Lumen Fidei, no número 47, ensina
que: "A unidade da Igreja, no tempo e no espaço, está ligada à unidade da
fé: 'Há um só Corpo e um só Espírito, (...) uma só fé' (Ef 4, 4-5). Hoje, pode
parecer realizável a união dos homens com base num compromisso comum, na
amizade, na partilha da mesma sorte com uma meta comum, mas sentimos muita
dificuldade em conceber uma unidade na mesma verdade. Parece-nos que uma união
do gênero se oporia à liberdade do pensamento e à autonomia do sujeito. Pelo
contrário, a experiência do amor diz-nos que é possível termos uma visão comum
precisamente no amor: neste, aprendemos a ver a realidade com os olhos do outro
e isto, longe de nos empobrecer, enriquece o nosso olhar. O amor verdadeiro, à
medida do amor divino, exige a verdade e, no olhar comum da verdade que é Jesus
Cristo, torna-se firme e profundo. Esta é também a alegria da fé: a unidade de
visão num só corpo e num só espírito. Nesse sentido, São Leão Magno podia
afirmar: 'Se a fé não é una, não é fé".
O Papa pergunta qual é o segredo desta unidade? "A fé é una, em
primeiro lugar, pela unidade de Deus conhecido e confessado. Todos os artigos
de fé se referem a Ele, são caminhos para conhecer o seu ser e o seu agir; por
isso, possuem uma unidade superior a tudo quanto possamos construir com o nosso
pensamento; possuem a unidade que nos enriquece, porque se comunica a nós e nos
torna um".
A imensa promessa e as energias vibrantes de uma nova geração de
católicos estão esperando para serem aproveitadas para a renovação da vida da
Igreja. Estejamos, particularmente, próximos dos homens e mulheres, dos jovens
e dos que estão na melhor idade, da infância e das crianças, e também dos que
estão empenhados em seguir Cristo sempre com maior perfeição na generosidade,
abraçando os conselhos evangélicos. Com o enfraquecimento progressivo dos
valores tradicionais cristãos e a ameaça de um período no qual nossa fidelidade
ao Evangelho pode nos custar muito caro, a verdade de Cristo não apenas precisa
ser compreendida, articulada e defendida, mas proposta com alegria e confiança,
como a chave para a realização humana autêntica e para o bem-estar da sociedade
como um todo, recordando que Cristo nos chama a viver a unidade que só Ele pode
nos dar. Nossa Igreja deve estar em permanente estado de missão. Que a unidade
que esperamos seja perpassada pelo nosso compromisso de fidelidade a Cristo, ao
seu Evangelho, em sintonia com a Santa Igreja, sendo santo na sua vida
cotidiana e eclesial. Viver a santidade não é um privilégio de poucos. Pelo
batismo todos nós recebemos a herança de nos tornarmos santos. Ser santo é uma
vocação para todos os fiéis. Todos nós somos chamados a percorrer o caminho da
santidade, e o caminho que leva à santidade e à unidade tem um nome e um rosto:
Jesus Cristo. No Evangelho, Ele nos mostra a estrada das bem-aventuranças.
Por isso, rezemos ao Cristo Redentor para que possamos acolher e
anunciar o Reino dos Céus. E isso somente será possível para aqueles que não
depositam sua confiança nas coisas humanas, no ajuntamento do ser, do ter e do
poder, mas no amor de Deus. Unidos em Cristo, buscando viver com o testemunho
dos Santos, sejamos encorajados a não ter medo de caminhar contra a corrente ou
ser mal-entendidos e ridicularizados quando falamos de Cristo e do Evangelho,
que evangelizamos para superar as diferenças, e, na diversidade de carismas e
como Igreja, possamos testemunhar Cristo "ut omnes unum sint".
Dom Orani João Tempesta, O. Cist
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)
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