Em meio a tantas manifestações que tenho visto nesses dias me veio dois
sentimentos: um de lembrança e outro de questionamento.
Lembrei-me de São Paulo quando, ao escrever aos romanos, exclama: “a
criação em expectativa anseia pela manifestação dos filhos de Deus”[1]. Essa
palavra fez eco no meu coração diante da insatisfação dos homens e mulheres
desse tempo, que saem às ruas pedindo por justiça.
Depois, o questionamento quanto ao meu papel como cristã, católica,
leiga consagrada inserida no meio secular. Sou chamada a só manifestar ou ir
além e testemunhar? Creio que seja polêmico generalizar e, por isso, prefiro
falar em primeira pessoa.
Também me sinto insatisfeita com os regimes políticos, também me sinto
cansada de assistir como num espetáculo o descaso com educação, saúde,
transporte, segurança, entre outros serviços. Também me sinto triste por ver,
como dizia o amigo João Paulo II, “o caos em que se encontra a humanidade”[2].
Mas, em meio aos desertos da fé, sinto-me impelida pelo Espírito a clamar ao
Senhor que “abra uma vereda no deserto, faça correr arroios pela estepe”[3],
realize uma Obra Nova nesse tempo. Diante do meu clamor escuto um grito de
Deus: “O que tens feito, minha filha? O que tens feito?” Daí posso, talvez, não
dar resposta ao meu questionamento, mas perceber que faço parte desse contexto,
que não posso me negar a contribuir, “não posso sufocar as queixas do meu
coração”[4] cristão que, como o de seu Mestre, olha a multidão e se compadece[5].
Dessa compaixão nasce a chave da questão, vem à minha mente uma grande
sabedoria para nós, cristãos: o testemunho.
O próprio Jesus, que realizou a grande divisão de águas da humanidade
com seus simples e concretos ensinamentos, ensinou-nos o caminho, fez esse
caminho antes de nós e nos convidou a estar no nosso lugar no mundo, o de
servos da humanidade e, ainda mais, prometeu-nos que faríamos coisas maiores do
que Ele[6].
Eis o tempo favorável para dar o melhor de nós, não só nas ruas, mas no
dia a dia, nas nossas casas, trabalhos, comunidades, paróquias, na sociedade.
TESTEMUNHO é palavra honrada pelos primeiros cristãos e pelos muitos homens de
nosso tempo que com radicalidade abraçam a causa de Cristo.
De manifestação em manifestação, mudam-se as estruturas políticas, mas
de testemunho em testemunho toca-se no lugar mais importante: o coração do
homem. Eis o nosso alvo! Eis as nossas bandeiras e armas: o testemunho na
vivência radical do Evangelho.
Termino citando o grande João Paulo II e pedindo a ele, que passou por
dois regimes totalitários, que me ensine a construir a civilização do amor.
Ensine-me a ser um tijolinho dessa construção, pois, sem mim, pela brecha que
eu possa deixar, toda edificação pode ser comprometida. Eis-me aqui! Envia-me,
Senhor.
“Quando penso no mundo, que se desvanece e morre pela falta de Cristo;
Quando penso no caos profundo em que se despenca a inquieta e cega humanidade
pela falta de Cristo; Quando me encontro com a força da juventude apática e
destroçada na própria primavera da vida pela falta de Cristo, não posso sufocar
as queixas de meu coração. Quisera multiplicar-me, dividir-me, para escrever,
pregar, ensinar Cristo. E do espírito mesmo do meu espírito brota contundente e
único grito: MINHA VIDA POR CRISTO![7]”.
Enne Karol
Missionária da Comunidade de Aliança Shalom
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