Chegamos à celebração
da Páscoa. A Páscoa, palavra que significa “passagem” e “pulo” (salto) em
hebraico, não é simplesmente a comemoração de uma festa religiosa, muito mais
que isso é um processo de contínuo esforço para sempre “passarmos para
condições mais humanas” e pularmos (saltarmos) sobre os males da vida;
portanto, mais que uma solene celebração litúrgica, a Páscoa é uma
espiritualidade que devemos sempre cultivar inspirando-nos na Ressurreição de
Jesus da qual deriva a visão otimista da vida e de sempre fazermos uma releitura
dos fatos da nossa história pessoal e social. Vivenciar a espiritualidade
pascal significa nos esforçarmos para viver de cabeça erguida, “aspirando às
coisas do alto” (II leitura), é testemunhar com nossas opções que Jesus Cristo
é o Senhor da Vida (I leitura) e testemunhá-lo com uma vida dinâmica, numa
contínua corrida pela promoção do Bem (Evangelho)!
Na primeira semana após
a festa da Páscoa, chamada oitava da páscoa – oito dias de solenidade
litúrgica, Pedro, líder dos discípulos, é quem toma a palavra testemunhando sua
fé no Ressuscitado. Com firmeza e clareza, estimula os judeus à conversão por
causa da morte de Jesus: “o mataram pregando numa cruz” (Atos 10,39). Os fatos
históricos da paixão, morte e ressurreição de Jesus estão ao centro do conteúdo
dos seus discursos. Pedro também afirma sua experiência concreta, pois “comeu e
bebeu” (símbolos de comunhão, de relação de amizade, de intimidade) com Jesus.
O “comer e beber” com Jesus é a experiência fundamental que marcou
profundamente a mente e o coração de Pedro (e dos demais) que o fazia
testemunhá-lo com alegria e coragem. A comunhão com Jesus, a experiência do
encontro do Ele, deve preceder o anúncio por parte do bom discípulo. Assim aconteceu
com os apóstolos. Não se pode anunciar quem não conhecemos e quem não amamos.
Do texto que nos é apresentado hoje Pedro testemunha que:
Jesus de Nazaré foi
ungido por Deus (= agia movido pelo Espírito Santo);
Andou por toda parte
fazendo o bem e curando (= promoção do Reino de Deus);
Os judeus o mataram
pregando-o numa cruz (= o Reino de Deus incomoda);
Deus o ressuscitou ao
terceiro dia (= Deus é o Senhor da história, Deus responde à violência
sofrida);
Pedro e os demais
discípulos comeram e beberam com Ele (= é a experiência de comunhão e amizade);
Jesus mandou pregar e
testemunhar (= compromisso atual de ser discípulos, a história deve continuar);
Quem crê Nele, recebe o
perdão dos pecados! (= obtém a salvação: crer é viver com Ele...).
Na verdade esse é o
programa de vida de toda a missão da Igreja que se alicerça da experiência de
vida e testemunho dos apóstolos e chega até nós que devemos continuar esse
anúncio e com o mesmo dinamismo.
Este é um salmo de
gratidão a Deus pela sua bondade e seu amor que se estende para sempre (cf. Sl
117,1-4.21.28-29). Esse sentimento de gratidão é a resposta do salmista a Deus
por causa dos benefícios recebidos: pelo socorro na angústia (cf. Sl 117,5),
pela presença que lhe trouxe segurança livrando-o dos inimigos que são vistos
como espinhos e vespas (cf. Sl 117,6-7.11-13). Tudo isso se transforma em
convicções profundas: “É melhor refugiar-se em Javé do que depositar confiança
no homem. É melhor refugiar-se em Javé do que depositar confiança nos chefes”
(Sl 117,8-9). Liberto dos males e ameaças o salmista assume um sério
compromisso: “Viverei para contar as obras de Javé” (cf. Sl 117,17).
Páscoa é esforço
permanente de prática da virtude! Paulo, à semelhança de Pedro, comunica aos
cristãos de Éfeso o que significa proclamar a Ressurreição de Jesus. Para ele,
neste texto, a Páscoa significa:
a) Esforçar-se para
“alcançar as coisas do alto”;
b) Aspirar às coisas
celestes e não às coisas terrestres. (cf. Ef. 3,2). Proclamar a Ressurreição é
fazer morrer em nós tudo aquilo que não se harmoniza com os valores do Reino de
Jesus Cristo. Buscar as coisas do “alto” é deixar-se envolver e dinamizar-se
pelas conseqüências das virtudes da Fé, da Esperança e do Amor. Isso significa,
por outro lado, combater a nossa tendência a fechar-nos nas “coisas terrenas”,
ou seja, deixando-nos orientar pela lógica da razão humana e dos instintos
egoístas (cf. Rm 8,1-13). Quando seguimos esse caminho, não sobra espaço para o
perdão, para o sacrifício, para a experiência da cruz da qual provém a glória.
Este trecho, no qual
João descreve a primeira constatação do sepulcro aberto e vazio por parte de
Madalena e logo comunicada a Pedro e João, serve como paradigma (modelo) para
toda comunidade cristã: a acolhida da ressurreição (fé!) deve gerar na
comunidade um dinamismo de comunicação, comunhão, reconhecimento e respeito
pelas competências e responsabilidades de cada um. Vejamos as atitudes dos
personagens: a) Maria Madalena: representa a pessoa sem fé! Madalena vai cedo
ao túmulo de Jesus, “bem de madrugada”, no primeiro dia da semana (domingo).
Constata que a pedra tinha sido retirada do túmulo, então ela saiu correndo e
foi encontrar Pedro e João (cf. Jo 20,1-2). Madalena, contudo, não se encontrou
com o Ressuscitado! Ela representa a comunidade ou a pessoa sem fé, que ainda
não assimilou ou não compreendeu o significado da Ressurreição. Madalena está
presa ao passado materialista: não vai ao encontro do Ressuscitado, mas deseja
é encontrar o corpo do senhor morto no túmulo. Quem já fez a experiência da fé
na Ressurreição vai ao encontro da Vida e dos Vivos e projeta-se para o futuro!
A corrida de Madalena representa o dinamismo ativista (= sem espiritualidade)
que pára de repente num encontro e só comunica susto, frustração, decepção,
perplexidade, confusão, angústia... Madalena só descreve os fatos que vê (é
humanamente honesta), mas não interpreta seu significado: falta-lhe a
experiência da fé. Está presa aos seus sentimentos. b) Pedro e João: estão
juntos e ao receberem a comunicação de Madalena saem correndo rumo ao túmulo.
João chega primeiro que Pedro, mas não entra, Pedro chegando, entra no túmulo.
Logo percebe algo que Madalena não viu: os sinais da ressurreição, ou seja, “as
faixas de linho e o pano enrolado num lugar à parte” (cf. Jo 20,6). “Ele viu e
acreditou”! (Jo 20,8). Madalena só viu que a pedra tinha sido retirada do
túmulo! Pedro e João representam a comunidade que já assimilou a Ressurreição
de Jesus e, portanto, sabe dar significado para aquilo que faz memória de Jesus
Cristo. Para quem tem fé, tudo tem um significado, não só descreve, mas lê,
interpreta, decodifica, tira lições de vida, acolhe perspectivas, deduz
consequências! Pedro e João representam a comunidade cristã composta de
multíplices sujeitos e responsabilidades. É o discípulo que ama a Jesus (João)
que respeita as competências dos demais; o discípulo amado e que ama, corre,
tem dinamismo proativo (corrida), não conflita e nem debocha do “velho
Pedro”... o respeita! A fé gera amor e o amor, sempre sendo uma realidade
dinâmica, produz harmonia e respeito entre as pessoas.
Homilia Dominical
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