Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor

O texto de Isaías 50,4-7 relata o terceiro canto do Servo Sofredor, que é marcado pela escuta da palavra de Deus, pela fidelidade no anúncio, pela perseguição e resistência. Ter a barba arrancada e receber cuspe no rosto são gestos dolorosos e humilhantes. A expressão “endurecer o rosto como pedra” mostra a resistência do servo. De quem o profeta está falando? Ficamos com a interpretação messiânica: segundo os autores do Segundo Testamento, esse ideal encontrou perfeita realização em Jesus: a profecia do servo sofredor descreve antecipadamente a vida de Jesus. Sua confiança em Deus e seu amor pelos irmãos deixam-no em uma suprema liberdade diante de qualquer provação. Ele tem certeza de que sua missão não é vã.

Realmente, Jesus assume a missão deste Servo misterioso; uma missão de discípulo que escuta, que encoraja os desanimados e apresenta resistência não violenta ante os sofrimento e humilhações que lhe são impostos pelos inimigos.

A carta aos Filipenses 2,6-11 canta, em síntese, toda a trajetória de Jesus Cristo. Este hino descreve o aniquilamento, o “esvaziamento” do Filho de Deus. Este aniquilamento expressa o movimento de Jesus que parte de Deus, desde a morte na cruz, e volta para Deus como Senhor. Jesus não teve medo e, como verdadeiro Servo sofredor, viveu consciente e livremente a nossa experiência humana até a morte. O caminho do Servo Jesus é o caminho da encarnação, da solidariedade com a humanidade sofrida. “Por isso, Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o Nome que está acima de todo nome” (Cf. Fl 2,9).

Jesus recebe do Pai um nome que está acima de todo nome: ele recebe o titulo de Senhor. Jesus Cristo é o Senhor do universo e da história. Ao nome dele toda a criação se prostra em adoração (Cf. Fl 2,10).

O hino cristológico da carta aos filipenses constitui a chave principal deste domingo: Jesus humilhou-se, se rebaixou e por isso Deus o exaltou. O hino descreve a preexistência do Filho; o mistério da encarnação, de sua paixão, morte e ressurreição. É nesta perspectiva que nós cristãos somos chamados a seguir os passos de Cristo, Senhor da história, como seus discípulos, renovar a nossa adesão a ele, na Grande Semana que inicia.

A entrada de Jesus como Messias em Jerusalém é descrita por Marcos 11,1-10. Jesus chega a Jerusalém para seu confronto com os poderes religiosos e políticos, presente nesta cidade, e que se armam para eliminá-lo. Ele não vem montado em animal de guerra, mas em um jumentinho, e é reconhecido por sua gente como enviado por Deus.

Neste ano B, é proclamada a Paixão de Jesus segundo Marcos. Esta narração se distingue por apresentar as testemunhas oculares da Paixão. Sendo o relato mais breve e mais antigo, talvez seja o que mais se prende aos fatos. Marcos descreve de modo muito realista, com muitos detalhes, a paixão de Jesus, que morre quase desesperado. O sofrimento que padece o homem Jesus atinge não só o corpo, mas também o seu coração.

Marcos apresenta Jesus, o Messias, como o Filho de Deus. Ele é interrogado diante do sinédrio sobre a sua identidade e a confessa (Cf. Mc 14, 61-62). É a única vez, no Evangelho de Marcos, que Jesus afirma ser o Messias, o escolhido de Deus para realizar seu projeto de liberdade e vida. O que parece blasfêmia para a sociedade que o mata (Cf. Mc 14, 63) é a maior profissão de fé de quem n’Ele crê e a Ele adere.

O sinédrio o rejeita e condena à morte. O oficial romano, um pagão, o reconhece como Filho de Deus: “Na verdade, este homem era Filho de Deus!” (Mc 15,39). Jesus é Messias-Rei, mas  a sua realeza não coincide com as padrões de poder e autoridade daquele tempo e de hoje.

A história da Paixão e Morte de Jesus Cristo não é algo distante ou sem interesse. Toda a humanidade e cada pessoa estão envolvidas nela, dela participam de alguma maneira e dela são chamadas a dar testemunho. Na verdade, cada um de nós poderá exercer o papel de Pedro, que nega o Mestre, mas se deixa atingir pelo olhar misericordioso de Cristo (cf. Mc 14,72).

Pode acontecer que façamos o papel de Pedro, Tiago e João: em vez de vigiarem, adormecem enquanto Jesus sofre a agonia de sua hora. Seremos talvez, em certas circunstancias da vida, as testemunhas falsas, os sumos sacerdotes, os anciãos e os escribas, que não reconhecem em Jesus o Filho de Deus bendito nem o Filho do Homem que verão sentado à direita do Pai.

De repente, poderá se manifestar em nós a figura de Pilatos, e, por covardia, acabamos por condená-lo. Seremos ainda o povo, preferindo Barrabás a Cristo. Por vezes, talvez contra a vontade, fazemos o papel de Simão Cireneu, ajudando a carregar a cruz de Jesus, pesando sobre os ombros da humanidade injustiçada e sofrida de hoje.

Cada pessoa já terá sentido em si os conflitos entre o personagem que faz o Cristo sofrer mais e aquele que se solidariza com ele e procura aliviar seus sofrimentos. Importa que, por entre os altos e baixos da vida, reconheçamos no Filho do Homem quem ele é, e digamos como o oficial romano, um pagão: “De fato, este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39).

Diocese de Limeira

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