O livro das Crônicas, posteriormente separados em dois, faz uma
releitura teológica da história do Reino de Judá. Pode-se dizer que os dois são
uma grande história do templo de Jerusalém, tão importante na vida do povo, por
ser o lugar escolhido por Deus para a sua morada. Crônicas foi escrito em
Jerusalém por volta dos 340-300 a.C. O livro é bastante sucinto na descrição da
tragédia que culminou com o exílio do povo.
Não interessa aos cronistas narrar a derrota da Casa de Davi,
com a destruição da cidade e do templo. Após rápidos registros inspirados no
segundo livro dos Reis (2Rs 23,31-25.30), sobre os últimos reis de Judá, os
cronistas narram a chegada de Ciro ao trono da Pérsia. Concluem a narrativa
transcrevendo o conhecido decreto real, que permitiu a volta dos exilados para
Judá.
Os cronistas encerram o livro (2Cr 36, 22-23) com o decreto de
Ciro (Cf. Esd 1, 1-3). O livro de Crônicas se dirige à comunidade de judeus que
voltaram do exílio, após setenta anos, e estão empenhados na reconstrução
de Judá. Após todos os erros dos seus reis, o povo conseguiu retornar por
benção e graça do Senhor. Dessa forma, a história precisa ser lida de
maneira positiva: Deus é o Senhor da história. Nada acontecerá ao povo,
enquanto o culto a Deus, celebrado no templo de Jerusalém, continuar a existir.
Preservar a nação e o culto se tornará a grande tarefa histórica
do povo, liderado pelos sacerdotes e levitas. É preciso, pois, uma nova
capacidade de escuta para compreender os caminhos com que o Senhor executa seu
plano. O povo infiel viu no retorno à sua terra e na reconstrução do templo a
salvação e a misericórdia de Deus.
Na segunda leitura (Ef 2, 4-10), encontramos os atributos de
Deus, provindos do Primeiro Testamento: rico em misericórdia, amor, favor e
bondade. Por sua iniciativa e por causa de sua misericórdia, Deus fez todos
passarem da morte para a vida, do pecado para a graça, e permitiu que todos
participassem antecipadamente da vida divina, por meio da ressurreição de Jesus
(cf. vv. 4-7). Tudo isso é dom maravilhoso da graça de Deus, em vista das
boas obras a serem praticadas (cf. vv. 8-10).
O Evangelho deste domingo (Jo 3, 14-21) é o encontro de Jesus
com Nicodemos. Este fariseu e membro do sinédrio percebe que a exigência de
Jesus está na transformação, no novo nascimento – mas não entende de que
maneira possa realizar-se tal mudança. Esta é possível somente no impulso do
Espírito, que leva a uma aceitação da proposta de Jesus – “quem nele crê
não será condenado” (3,18) – e então, a uma prática segundo a verdade, realizando
as obras de Deus (Cf. 3,21).
O Batismo é o sinal – sacramento – dessa transformação radical,
que provoca um agir na verdade e na luz.
Essa transformação que permite entrar na novidade do Reino
realiza-se plenamente na cruz de Jesus: “Como Moisés levantou a serpente do
deserto, assim também será levantado o Filho do Homem, a fim de que todo o que
nele crer tenha a vida eterna” (Cf. 3, 14-15).
Não há como entrar nessa perspectiva nova do Reino sem passar
pela noite da cruz – que é morte a todo um mundo de falsidade e opressão, e
assim ressurgir para uma novidade de vida.
A experiência de morte e vida feliz ou salvação, feita pelo povo
de Israel, prefigura a experiência de toda a humanidade. Longe de Deus ela se
encontra na desgraça. Acolhendo a Deus, a manifestação de sua misericórdia em
Cristo Jesus, ela vive. Para toda a humanidade Deus manifestou sua misericórdia
em Cristo Jesus, seu Filho. Como a serpente no deserto, também ele é elevado da
terra num gesto de amor ao Pai e à humanidade toda, entregando sua vida pela
salvação do mundo. Assim, o templo de Deus no mundo faz com que todo o mundo
possa transformar-se em templo de Deus.
Dessa forma, Jesus Cristo torna-se luz do mundo. Todo ser humano
que nele crê não anda nas trevas. Também ele se torna luz. E luz é símbolo de
alegria, de felicidade e de salvação.
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