O carnaval nos faz feliz?

Carnaval: Real ou Fantasia? Tudo se acaba na quarta-feira... “Atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu...” O ritmo efervescente entre a Cabrocha que ensaiou o ano inteiro esperando o Carnaval chegar para desfilar e o trançado das pernas, que só mesmo a dança do frevo, é capaz de inspirar os foliões a fazerem do carnaval a festa mais popular do nosso país.

Espalhado por todo o Brasil, em uma mistura de ritmos e de gente, o chão da praça esquenta com os movimentos frenéticos dos foliões. E essa fantasia, desejada por todos que lá estão que seja eterna, termina na quarta-feira, dia em que tudo acaba em Cinzas. Já cantava Netinho em cima do Trio Elétrico, na Bahia: ““Eu queria que essa fantasia fosse eterna...” ” e pedia muito mais, que “um dia a paz vencesse a guerra “ e que “viver seria só festejar”.

Atenta e também tentada a dar os meus pulos, eu ficava ali imaginando como seria se de fato aquela fantasia fosse eterna. Ou, se era possível viver festejando nem que saiba naquele Carnaval. Quanta ingenuidade, não? A paz vencer a guerra. Num ambiente de guerra, paz, por mais que seja convidada, não encontrará espaço para cumprir o seu papel. Falta-lhe parceiros, o número dos que querem não é suficiente. Mas, eu não precisaria estar me exigindo com tantas reflexões, porque, afinal, o cantor já classificou o carnaval como a festa da fantasia. Porém hoje, eu tenho me questionado se de fato é uma fantasia ou uma realidade? Às vezes as pessoas se escondem em sua própria vida e nas oportunidades se liberam. A própria festa autoriza os foliões a serem o que queriam ser. Aí está o perigo dessa época carnavalesca. Existe uma motivação explícita para que as normas do bem comum sejam quebradas. Quem nunca ouviu as expressões: no carnaval vou soltar a franga? Ou, no carnaval a minha mulher me deu um vale-nith? Ou, eu quero mais é beijar na boca? Longe de qualquer julgamento, o que muitos foliões gostariam de viver fora dessa época e não vivem? Ou que vivem, mas ninguém vê? Será a fantasia uma oportunidade para fugir do real?

Para o distanciamento da realidade ou para sua aproximação? Não acredito que quem não tem tendência a se desfigurar no Carnaval, vá assumir uma conduta que o leve a uma ressaca moral.

Portanto, o comportamento do folião deveria ser um meio para levar e trazer para si alegria, encontro com os amigos e familiares, enfim, à diversão. Ao contrário de épocas atrás, o pierrô e a colombina foram substituídos pela exploração sexual de menores, tráfico de drogas, manipulação da mídia favorecendo ao governo e fazendo dos próprios participantes uma propaganda para atrair turistas, além da prostituição, adultério, violência, roubo, e interesses financeiros... Consequências de um ano, intensificadas nesse período. O espírito carnavalesco quando incorporado sem medir resultados traz danos muitas vezes irreparáveis.

A letra de Tom Jobim nos ajudará a enriquecer essa reflexão: “"a felicidade do pobre parece a grande ilusão do carnaval". A gente trabalha o ano inteiro por um momento de sonho, pra fazer a fantasia de Rei ou de Pirata, de Jardineiro e tudo se acaba na quarta-feira”. Mas não podemos negar que apesar de tudo algo motiva os foliões a estarem ali onde já estive por tantos anos, na Micareta da minha cidade. Essa festa era e ainda é um carnaval fora de época. Não se tinha abadá, mas todos vestiam mortalha, alguns se fantasiavam de careta e os pais, levavam seus filhos ao clube, sempre as meninas de baianas ou bailarinas, os meninos de pirata ou de super-heróis.

Arriscarei aqui a dar alguns palpites sobre os motivos que devem estimular a muitos a gastar o dinheiro do ano inteiro para estar lá. Talvez seja a necessidade de ser feliz, extravasar dores, tristezas, mágoas, apertos financeiros... Real ou de fantasia, não sei mais, o que sei é que tudo acaba na quarta-feira, em que se inicia a Quaresma, tempo de jejum e oração para os católicos.

A testa marcada com as cinzas caracterizando a Paixão de Cristo. O Cristo que sem julgamento, recebe o folião que pulou até o último dia para continuar mostrando que aquela fantasia não é eterna e que eterno é o que não acaba na quarta-feira, mas inicia.

A Quarta-feira de Cinzas , que vem acompanhada da Sexta-Feira da Paixão, dias que a tradição não aconselha comer carne, nem satisfazê-la. Portanto, chegou a hora de decidirmos por um Carnaval que não precise acabar na quarta-feira... Meus amigos, então não é o Carnaval que dará sentido ao que buscamos, mas justamente Aquele que é Eterno.

Judinara Braz

Diretora Pedagógica da Escola João Paulo I – Feira de Santana (BA)

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