Em sua Carta Apostólica sobre o significado cristão do sofrimento humano (já expressa em nosso trabalho), “Salvifici Doloris” (1984, n° 26), o saudoso Pontífice João Paulo II expressou, com maestria, a ideia enunciada: A dor humana como lugar de "revelação".
“Temos visto, através dos séculos e das gerações, que há no sofrimento um certo poder escondido, ou seja, uma graça especial que leva a pessoa, interiormente, para perto de Cristo. Uma graça particular.
A esta ficaram a dever a sua própria conversão muitos santos, como, por exemplo, São Francisco de Assis, Santo Inácio de Loyola, etc. O fruto de semelhante conversão é não apenas o fato de que o homem descobre o sentido salvífico do sofrimento, mas sobretudo que no sofrimento ele se torna um homem totalmente novo”.
De fato, a partir do evento Cruz, a dor humana se tornou um lugar privilegiado de manifestação/revelação do Sagrado, da presença e ação do próprio Deus, que, no mistério de sua Sexta-feira Santa, atrai a si todos os homens (cf. Jo 12,32). E este poder escondido – acima citado pelo Pontífice – presente no mistério da dor, manifesta, concretamente no território humano, a sua graça particular: No “alto do madeiro” o coração do homem sofredor tende a se dilatar e, a consequentemente, se questionar sobre a própria existência e sobre sua finalidade no solo de nosso tempo.
Precisamente aí ele “pode” – exercendo sua liberdade de criatura – olhar a seu lado e perceber que não está só, pois com ele está também o “Crucificado por excelência”, acompanhando-o em seu sofrer cotidiano e manifestando-Se a ele em expressão máxima de amor/doação por intermédio do emblema de sua dor.
O Crucificado da Sexta-feira Santa se torna presente na dor dos sacrificados do mundo. A paixão do mundo é alcançada e fermentada pela Paixão de Cristo, de modo que o peso da finitude não se torna ocasião de desespero e de condenação, mas caminho de ressurreição e de vida.
Ele, que, por amor à criatura humana e em obediência ao Pai, “foi transpassado” (cf. Zc 12,10; Jo 19,37) pela dor/finitude e pelo abandono, acompanha todos os crucificados de nossa terra, oferecendo a estes um perene sentido para seu sofrer, e inserindo-os em valores que transcendem a imanência (visão encerrada na finitude) própria da criaturalidade humana.
Na cruz do homem o Crucificado se desvela profundamente sob o signo do amor: “mais forte que a finitude e a morte” (cf. Ct 8,6b), e que tudo redime em seu sacrifício de obediência e liberdade.
Assim sendo, a partir de Cristo sofredor, a dor do homem se torna um específico território de revelação de um Deus que não o abandona à mercê de seus próprios dissabores, mas, que segue com ele até o fim de sua “Via Crucis” (Via dolorosa; em seu caminho de sofrimentos). Como consequência de tal compreensão, a dor do homem acaba por manifestar-se como uma perene possibilidade de redenção/salvação e, evidentemente, como um preciso espaço de revelação para os que a experienciam e para toda a humanidade.
Padre Adriano Zandoná
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