Abre-se a porta da
misericórdia! O Pai das Misericórdias enviou Seu Filho amado ao mundo e
derramou sobre a humanidade a unção do Espírito Santo, para a festa do perdão,
arte das artes, que tem na Trindade Santa sua fonte e realização, em benefício
da humanidade. Abre-se a porta da Quaresma. Proclamamos, nesta semana, a
necessidade da Penitência, com a Quarta-feira de Cinzas, pois, pelo doloroso
mistério do pecado, pesa um sinal de condenação sobre a humanidade. Graças ao
amor misericordioso de Deus não há pecado, por maior que seja, que não possa
ser perdoado, nem pecador que seja posto de lado. Todas as pessoas que se
arrependerem serão recebidas por Jesus Cristo com perdão e imenso amor. Diante
de tamanha bondade, cabe-nos responder com a sinceridade da vivência quaresmal.
O pregão bíblico da penitência, com o gesto da imposição das cinzas, vivido
pela Igreja, quer ser o convite a que todos estejam dispostos a morrer para o
homem velho.
A Igreja aprendeu e
ensinou, no correr dos séculos, a importância do tempo, como oportunidade da
graça de Deus, por meio do que chamamos Ano Litúrgico, com o qual percorremos o
ciclo dos mistérios de Cristo, colhendo todos os presentes que são oferecidos.
O tempo da Quaresma é o convite a voltarmos os olhos para a Páscoa, dedicando
as próximas semanas à revisão de vida, prática da penitência, do sacramento da
reconciliação, da leitura orante da Palavra de Deus, da participação na
Eucaristia e no exercício da caridade.
A cada ano, a Igreja
oferece temas e propostas de vida nova a todos os cristãos. O Papa Francisco
desejou, neste ano de 2015, convidar-nos a refletir e mudar de atitude, na
superação de um dos desafios mais urgentes, a globalização da indiferença.
Diz o Papa: “Dado que a
indiferença para com o próximo e para com Deus é uma tentação real também para
nós, cristãos, temos necessidade de ouvir, em cada Quaresma, o brado dos
profetas que levantam a voz para nos despertar”. Depois de indicar passos a
serem dados pela Igreja, pelas paróquias, comunidades e por todos os cristãos,
considerados pessoalmente, assim convidou: “Para superar a indiferença e as
nossas pretensões de onipotência, gostaria de pedir a todos para viverem este
tempo de Quaresma como um percurso de formação do coração, a que nos convidava
Bento XVI (Carta encíclica Deus caritas est, 31).
Ter um coração
misericordioso não significa ter um coração débil. Quem quer ser misericordioso
precisa de um coração forte, firme, fechado ao tentador, mas aberto a Deus; um
coração que se deixe impregnar pelo Espírito e levar pelos caminhos do amor que
conduzem aos irmãos e irmãs; no fundo, um coração pobre, isto é, que conhece as
suas limitações e se gasta pelo outro. Por isso, amados irmãos e irmãs, nesta
Quaresma, desejo rezar convosco a Cristo: ‘Fazei o nosso coração semelhante ao
vosso’ (Súplica das Ladainhas ao Sagrado Coração de Jesus). Teremos assim um
coração forte e misericordioso, vigilante e generoso, que não se deixa fechar
em si mesmo nem cai na vertigem da globalização da indiferença”.
Também no Brasil
acontece um intenso esforço de mudança de vida, com a Campanha da Fraternidade,
realizada anualmente na Quaresma, desde 1964, com a qual deseja oferecer nossa
contribuição à sociedade, para a construção de um mundo melhor. Em 2015, nossa
Campanha é sobre “Fraternidade: Igreja e Sociedade”, com o lema “Eu vim para
servir” (Cf. Mc 10, 45). O bonito cartaz da Campanha retrata o Papa Francisco
lavando os pés de um fiel na Quinta-feira Santa de 2014. A Igreja atualiza o
gesto de Jesus Cristo ao lavar os pés de seus discípulos. O lava-pés é
expressão de amor capaz de levar a pessoa a entregar sua vida pelo outro.
A Igreja católica
participa das alegrias e tristezas do povo brasileiro, e quer dar a sua
contribuição, para que nosso povo seja mais disponível ao serviço das pessoas
umas às outras. Queremos manter uma atitude de serviço, diálogo e cooperação.
Queremos atuar em favor de tudo o que eleva a dignidade humana. Nossa
colaboração quer ser ainda uma resposta ao convite do Papa para maior atenção
aos pobres e sofredores, indo às periferias geográficas e existenciais, uma
Igreja em saída, como diz o Papa Francisco.
Alguns temas serão
tratados com intensidade e vão se transformar em prática dos cristãos, como
fruto da Campanha da Fraternidade: a proteção dos direitos fundamentais das
pessoas, o bem comum, a justiça social e o serviço da Igreja à sociedade.
Desejamos procurar continuamente o que Deus quer de nós, discernindo nossas
ações a partir do que existe em nossas comunidades, atuando por meio das
pastorais sociais, dialogar com todas as forças da sociedade em vista do bem
comum, introduzir cada vez mais o tema da paz e da superação da violência em
nossas orações e nosso comportamento, acompanhar pessoas e famílias em situação
de conflito, participar de forma consciente e construtiva no caminho do país
para a reforma política.
Os cristãos não desejam
privilégios, mas têm o direito de participar da vida da sociedade. Sabemos que
existem posições contrárias à religião, numa sociedade que pretende cancelar as
referências à transcendência e o reforço do individualismo. Há assuntos graves
que pedem a participação de todas as forças da sociedade, como a educação, a
saúde e a paz social. A Igreja tem uma palavra a dizer sobre esses temas e
propõe modos de vida que não excluam pessoas e grupos da sociedade. Acolhendo o
convite do Papa Francisco, em sua mensagem quaresmal, os católicos não se
deixarão tomar pela globalização da indiferença. Saberão chorar com os que
choram e rir com aqueles que riem (Cf. Texto-base da Campanha da Fraternidade
2015).
Começa uma “Campanha”,
esforço intenso, durante a Quaresma, unindo forças humanas e corações
iluminados pela fé. Uma Campanha “da Fraternidade”, sonhando alto e fazendo a
nossa parte para que homens e mulheres de nosso tempo sejam mais fraternos. É
uma Campanha da Igreja, que pretende ser “Campanha de Opinião Publica”,
contribuindo para a elevação do nível de vida do povo brasileiro. O caminho
está em Cristo, que veio “para servir”.
Dom Alberto Taveira
Corrêa
Arcebispo da
Arquidiocese de Belém – PA.
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