O Levítico, no capítulo 13, trata das doenças de pele a serem
diagnosticadas pelos sacerdotes. Entre essas doenças aparecia a lepra. Não
existe nesse livro preocupação alguma com a cura. Simplesmente, traçam-se
normas higiênicas. A única preocupação era com a pureza da comunidade.
Na verdade, a lepra, constituía a mais grave forma de impureza
ritual. Os sacerdotes eram os responsáveis pelo diagnóstico da lepra. Isso leva
a crer que a lepra estava intimamente ligada com a impureza ritual. O aspecto
religioso era mais importante do que o aspecto médico-sanitário.
O leproso era uma espécie de excomungado e banido da sociedade.
Logo, essa pessoa não tinha acesso a Deus. Quem fechava ou abria a porta do
acesso a Deus eram os sacerdotes, mediante o diagnóstico puro/impuro.
O complicado e misterioso sacrifício previsto para as pessoas
que eventualmente sarassem da lepra demonstra que ela era vista como sinal do
pecado contra Deus. É a partir disso que o leproso se torna símbolo da maior
marginalização possível: castigado por Deus por causa do pecado.
O modo como o leproso deve se comportar demonstra que ela se
tornou uma perigosa fonte de contaminação: roupas rasgadas, cabelos soltos,
“verdadeiro espantalho vivo”! E ainda devia viver gritando a todos sua
marginalidade e periculosidade.
Na carta aos Coríntios, Paulo dá uma orientação: “Quer comais,
quer bebais, quer façais qualquer coisa outra coisa, fazei tudo para a glória
de Deus” (10,31). Deixa claro que Deus precisa se manifestar e se tornar
presente em todos os gestos e ações da comunidade. Portanto, a ação de cada
pessoa deverá ser uma ação responsável.
Os cristãos de Corinto não podem ser motivo de escândalo para os
judeus, para os pagãos e muito menos para a Igreja de Deus. E aconselha: “Como
também eu me esforço por agradar em tudo a todos, buscando não o que é
vantajoso para mim, mas o que é vantajoso para o maior número de pessoas, a fim
de que sejam salvas” (11,33). E o interesse de todos significa o encontro de
toda a humanidade com Deus, em Jesus Cristo. Essa é a glória de Deus. É isso
que Paulo busca sem descanso. É para isso que a comunidade é chamada: “Sejam
meus imitadores, como eu também o sou de Cristo”.
No Evangelho, Marcos vai mostrando sempre mais quem é Jesus. O
leproso conhecia muito bem o código de pureza. Sabia também que nem o Templo
nem os sacerdotes poderiam libertá-lo da lepra. Eles apenas constatavam a
doença e nada mais.
Diante disso o leproso toma uma decisão radical: não vai ao
sacerdote e sim a Jesus. Ajoelha-se e pede: “Se queres, tens o poder de
purificar-me” (1,40). Reconhece que o poder de cura não vem da religião dos
sacerdotes, mas sim de Jesus. O leproso aproxima-se e manifesta sua adesão a
Jesus enquanto fonte de libertação.
Jesus quer curar e sente compaixão, indigna-se com a lei e todas
as prescrições de pureza. Transgride o sistema religioso e também se torna
impuro, por isso, não pode entrar nas cidades. Está impuro por causa do contato
com o leproso. De fato, se acreditava que a lepra fosse contagiosa. Jesus
quebra o código de pureza, tocando o leproso.
Com isso, além de se tornar impuro, precisa oferecer um
sacrifício de purificação. Com isso, o Filho de Deus foi morar com os
marginalizados. Assim, Marcos mostra quem é Jesus: é aquele que rompe os
esquemas fechados de uma religião segregadora, indo habitar entre os banidos do
convívio social.
Jesus dá uma ordem ao curado: “Não contes nada a ninguém! Mas
vai mostrar-se ao sacerdote e apresenta, por tua purificação, a oferenda
prescrita por Moisés. Isso lhes servirá de testemunho” (1,44), significava, ao
que parece, em não relatar a cura, mas colaborar para que o código de pureza
fosse abolido.
Ele deve mostrar-se ao sacerdote para que este constate sua
cura. Sinal de que a cura não depende do código de pureza nem da religião do
Templo.
A expressão “isso lhes servirá de testemunho” significa: o sacrifício
serve como testemunho contra o sistema que o declarava um punido por Deus e
banido do convívio social. O sacrifício tem, pois, caráter de denúncia e
abolição do código de pureza.
Marcos atesta que de toda a parte o povo vai procurá-lo, sinal
de que está aberto um novo acesso a Deus. Deus, em seu Filho, pode ser
encontrado fora, na clandestinidade, entre os que o sistema religioso e social
discriminou.
Diocese de Limeira
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