Abraão
é exemplo de obediência a Deus; a vivência da fé está sempre ligada à sua
pessoa. Pela fé, ele se torna fonte de bênçãos para todas as famílias da terra.
Mas,
como aconteceria isso se Abraão não tinha filho? Finalmente, ele recebe um
filho, Isaac, no qual sua descendência seria numerosa como as estrelas do céu e
as areias do mar. Isaac é o fruto da promessa, o filho muito amado, a esperança
do futuro.
Observando
porém, que os povos vizinhos de Israel sacrificavam crianças aos seus deuses
para manifestar o amor que tinham por eles, Abraão começa a se perguntar se
também o Deus de Israel queria que ele sacrificasse o seu único filho. Mas,
Deus não aceitou o sacrifício de Abraão e isto fez o povo entender que Deus não
quer sacrifícios humanos, não quer a morte do homem, mas a vida (cf. Jo 10,10).
Abraão passa, então, a considerar Isaac como sinal de Deus: nascido de Sara
estéril e liberto da morte.
A
narração (Gn 22, 1-2.9a.10.15-18) quer mostrar que a disponibilidade da fé de
Abraão é agradável a Deus, que renovará as promessas a ele feitas. Abraão viveu
a fé em situações adversas: acredita que podia ser pai, apesar de sua velhice e
de Sara; acredita que a obediência a Deus está cima dos próprios laços de
sangue (sacrifício de Isaac, o primogênito). Na realidade, o pano de fundo
deste quadro bíblico bem antigo reforça ainda mais a fé de Abraão no Deus da
Vida.
Abraão
se encontrava em um dilema: seguir os costumes da religião cananeia, que
ordenava sacrificar o primogênito para ter a benção dos deuses? Ou confiar no
Deus da vida que mandava acreditar na promessa? O núcleo central do texto de
Gênesis proclamado neste domingo é crer, mesmo em meio à escuridão. Abraão cala
diante do mistério. Ele teve de enfrentar tudo sozinho, o silêncio é envolvido
pelo mistério incomparável de Deus, superando pela fé e confiança os absurdos
que a vida lhe apresentava.
Na
segunda leitura (Rm 8, 31b-34), descobrimos que a fidelidade de Deus, anunciada
na primeira leitura, é aqui plenamente proclamada: Deus está com todos os que
têm fé e que por ela são justificados (cf 8,30).
O
texto paulino segue na linha de pensamento da primeira leitura: Deus não poupou
seu próprio Filho, para que, ele intercedesse por nós (cf 8,32). E em sua
fidelidade ao Pai, Cristo dá a vida por nós, não quer condenar-nos. “Se Deus é
por nós, quem será contra nós?” (8,31b). Se Deus não é contra nós, não nos nega
nada, não nos acusa, não nos condena. Esse argumento pode resumir-se em uma
pergunta: “Quem nos separará do amor de Deus em Cristo Jesus? Deus jamais
romperá a sua Aliança conosco, pois ele é um Deus fiel. Nele temos a certeza da
vitória, a libertação plena.
O
texto da transfiguração se encontra no meio da narrativa de Marcos. Os
discípulos, finalmente reconheceram em Jesus o Messias, o Cristo (Cf. 8,29).
Mas Jesus lhes explica que o “Filho do Homem”, como se chama a si mesmo (Cf. Dn
7,13-14), não devia ser imaginado como um Messias conquistador, à maneira do
rei Davi, e sim, como o Servo Sofredor de Isaías 52, 13-53,12. O destino do
Messias é a glória, mas o caminho é a cruz.
A
cena da alta montanha (Marcos não diz de que monte se trata!) repete a do
Batismo de Jesus no Jordão e prefigura sua morte e ressurreição: “Este é meu
Filho amado” (cf. Mc 9,7; 1,11). Devemos relacionar também a cena da
transfiguração com a que se encontra no fim do Evangelho de Marcos, quando o
véu do Santuário foi rasgado em dois, de alto a baixo, o centurião romano, ao
pé da cruz, exclama: “Realmente este homem era Filho de Deus” (cf. 15, 38-39).
A
descrição de Marcos possui especial beleza. Ele diz que Jesus tem suas vestes
mudadas, tornando-se brilhantes, extremamente brancas, de uma brancura tal que
nenhuma lavadeira sobre a terra as poderia alvejar. As vestes de Jesus agora se
parecem com as dos mártires (cf. Ap. 3,15-18; 7, 9-14). O martírio será o seu
destino, mas a vitória será sempre da Vida.
Jesus
está acompanhado de Moisés e Elias (Lei e Profetas), que confirmam com suas
histórias o caminho de Jesus na direção do conflito final e da cruz. Esses dois
personagens do Primeiro Testamento não estão presentes como enfeites ou
convidados de honra ou testemunhas da glória de Jesus. Eles aí estão para
explicar a Jesus qual é a sua missão como Filho. Essa missão consiste em sair
deste mundo, em fazer uma Páscoa, em sofrer uma Paixão.
Pedro,
porém, toma a cena como se fosse de triunfo, e com sua proposta – armar três
tendas – espera desviar Jesus do trajeto já indicado. Na verdade, Pedro não
sabia o que estava dizendo, porque tanto ele como seus companheiros, Tiago e
João, estavam com muito medo (cf. Mc 9, 5-6), Não seria bom ficar no monte,
porque ficar ali em vestes brancas e brilhantes, seria não ouvir a resposta de
Moisés e Elias ao “este é meu Filho amado” pronunciado pelo Pai: Filho é aquele
que tem o destino de sofrer em favor de seu povo.
Filho
é aquele que obedece, aquele que é destinado a sofrer por seu povo, aquele que
perdoa e se doa. Filho é aquele cuja glória é restaurar-nos à plena amizade com
seu Pai, a todos nós, começando por Jerusalém e estendendo-se até os confins da
terra.
Agora,
sabemos o que é ser Filho de Deus. É obediência/reverência; é abraçar o destino
de viver e morrer pelo povo; é amar os inimigos no momento de ser crucificado
por eles, e encontrar sua única esperança no Pai invisível e silencioso; é ser
o ministro vitorioso da reconciliação com Deus e com o próximo para toda a
humanidade.
A
passagem – Páscoa – de Jesus pela morte o levará à ressurreição: “por isso,
Deus o exaltou e lhe deu um Nome que está acima de todo nome” (Fl 2,9).
Diocese
de Limeira
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