Alguns elementos quase que desapareceram completamente dos festivos
juninos, outros rarearam de tal modo que com muita dificuldade os vemos em
nossos dias. Por motivos de segurança, desapareceram os belíssimos balões que
enchiam de leveza e sedução os céus de minha infância; as residências com
pequenas bandeirolas decorando-as e as ruas transformadas em arraiais dos
folguedos matutos são praticamente impossíveis de ver com a naturalidade com a
que eram encontradas anos atrás; as fogueiras que na década de 70 estavam
presentes na frente de cada residência, hoje são encontradas apenas nas
fachadas dos mais tradicionais, até porque muitos de nós moramos em
apartamentos que ou inviabilizam ou esvaziam de sentido tudo isso.
Para os saudosistas como eu, já não existe a Festa de São João, pois já
não há quadrilhas que não sejam dedicadas exclusivamente para dançarinos
profissionais, não se encontram mais espaços onde seres “desuingados” como o
autor deste texto, possa se alegrar e sorrir com seus pares na levada dos
balancês e alavantus. Lembro como muitas vezes eu chegava em casa, depois de ir
de arraial em arraial durante toda madrugada, por volta das 5h da manhã e
passava pelos restos das fogueiras que tinham ardido durante toda a noite. Elas
haviam passado pelas várias fases, a beleza da incandescência inicial, com
labaredas altas e violentas, depois aquele ardor contínuo e leve, até chegar
aos estertores, às cinzas ainda reluzentes, o melhor momento para assar um
milho verde. Mas há fogueiras que não se apagam nunca. Que foram acesas há dois
mil anos e continuam como na primeira noite.
Nos Evangelhos existem duas e apenas duas fogueiras, ambas relacionadas
à pessoa de São Pedro. A primeira foi acesa no pátio exterior da casa de Anás,
sogro do sumo-sacerdote Caifás, para onde Jesus foi levado depois de ter sido
preso no jardim do Getsêmani (Lc. 22:55). Ali, assentou-se Pedro, tentando
passar desapercebido no meio dos curiosos que se aglomeravam naquele local para
saber qual seria o destino do Rabino Galileu. Foi nesta geografia que se
realizou a tríplice negativa do apóstolo, afirmando em meio a juras e
impropérios que não conhecia o Encarcerado. Esta é a fogueira da queda, da
vergonha, da negação, do desrespeito. Nela os ideais e os compromissos de amor
foram queimados, lançados ao fogo pela covardia associada à fraqueza. O
resultado desta combustão terrível é a amargura de alma, foi assim que o
pescador deixou aquele local e assim deve ter permanecido muitos dias, mormente
porque em seguida Jesus foi julgado, crucificado e morto… e Pedro não estava
lá.
Graças a Deus há outra fogueira. Esta não foi acesa pela curiosidade,
pela necessidade ou pelo medo, mas por amor. Refiro-me àquela que foi acesa por
Jesus, já ressurreto na praia do Mar da Galiléia (Jo. 21:9), lugar onde três
anos antes ele havia travado os primeiros contatos tanto com Pedro, quanto com
André e João. Os discípulos tinham voltado à antiga prática da pescaria, eles
costumavam fazer isso durante a madrugada com o objetivo de atrair os peixes
com a claridade de suas lamparinas, mas naquela noite, mais uma vez, eles não
tinham tido sucesso, estavam terminando o trabalho daquela noite sem terem
colhido nenhum resultado. Quando se aproximaram da margem, ouviram uma voz de
homem que lhes perguntava se tinham apanhado alguma coisa e eles responderam
que não. Foi então que este homem lhes disse: “joguem do lado direito suas
redes!”. Fizeram isso e pescaram muitíssimos peixes. Aquela frase e aquele
resultado levaram a João a recordar, a ter uma sensação de deja vu, e se deu
conta que este homem era Jesus.
Eles puxaram os barcos para a praia e encontraram Jesus assentado em um
canto, com a fogueira acesa e com alguns peixes assando, bem como pão para uma
refeição matinal que teriam ali. Esta é a fogueira da restauração, ela não é
apenas acesa por Jesus, os pães e peixes também são dele, ele tudo provê. Foi
ali bem perto que o Salvador perguntou a Pedro: “tu me amas?” E ouviu por três
vezes a mesma resposta do pescador: “Eu te amo”, ao que lhe disse Jesus:
“apascenta as minhas ovelhas”. Sobre cada negação Cristo sobrepôs uma
oportunidade de reafirmação da fé e do compromisso. Para cada ato de renovação,
Jesus ofereceu uma corroboração da mesma antiga vocação de amor e serviço ao
próximo.
Amigo, irmã… pode ser que você esteja vivendo a tristeza e a amargura da
queda, ao redor da fogueira do desencontro, mas fique sabendo que seja lá o que
você tenha feito, dito ou deixado de fazer, há uma outra fogueira para onde
você pode ir. É lá que Jesus está lhe esperando para comer com você um
sanduíche de peixe e te oferecer perdão e verdadeira paz, por falar nisso… Paz e Bem!
Com carinho,
Martorelli Dantas
Retirado do Site da Comunidade Cristã
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