Domingo dos que dizem e não fazem

É possível que a redação desta passagem do evangelho de Mateus reflita a época em que os cristãos já tinham sido excluídos da comunidade judaica, de forma que o texto seja muitíssimo marcado pelo contexto da polêmica entre cristãos e judeus. A descrição e caracterização dos doutores da lei e dos fariseus não concorda em tudo com o que sabemos por outras fontes. E é fundamental que nos despojemos de um certo anti-semitismo ou de uma sempre tentada comparação entre uma aliança e outra, entre uma religião e outra, como se uma fosse melhor e outra, pior.

Numa fala de cunho nitidamente profético, Jesus procura chamar a atenção para a idolatria que pode estar escondida em qualquer prática religiosa, seja do tempo de Jesus, seja do nosso tempo: a contradição entre o dizer e o fazer ou entre a atitude do coração e o gesto exterior, a ambição pelos títulos, a sedução pelo poder, a busca de prestígio e ascensão pessoal. Tudo isso pode esconder, enfraquecer ou mesmo nos afastar da relação com o único Mestre, o único Pai, o único Guia.

O final do trecho ouvido apresenta um caminho de superação desta idolatria e de unificação do coração: o serviço. Por isso, em oposição ao retrato dos escribas e fariseus, Jesus pinta o retrato dos discípulos. À soberba dos que se vangloriam de títulos, os discípulos devem responder pela humildade e pela consagração ao reino. A nossa referência é o próprio Cristo, que “não veio para ser servido, mas para servir”.

Desta forma, o reunir-se em comunidade, o celebrar e o cantar o louvor de Deus não dispensam a conversão e a contrição do coração. O símbolo da cruz, trazido solenemente em procissão, na saída e na entrada de cada celebração, mantém diante de nossos olhos este horizonte e esta perspectiva da contínua e constante necessidade de conversão.

Retirado da Revista de Liturgia

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